terça-feira, 12 de janeiro de 2010

A Foca e Winnie de Pooh - um diálogo

Aviso: o texto que se segue foi escrito de seguida, às tantas da madrugada, e tendo com único objectivo a diversão pessoal e descomprometida. Partiu do desafio criativo de escrever um diálogo completamente improvisado entre duas personagens aleatórias e ver o que saía dali. Se se ofenderem facilmente por um ou outro palavrão ou quiserem manter a ideia de que eu tenho qualquer tipo de bom gosto naquilo que aqui coloco no blog, é aconselhável que interrompam a leitura imediatamente.



- Tenho os ombros a pelar, foda-se! - disse a foca.


- Eu avisei te para pores protector - disse o Winnie de Pooh.


- Não percebo como podem haver ursos amarelos.


- Agora estás a ser descriminista - respondeu Pooh.


- Nem falar sabes, urso de merda. Sabes como se diz o teu nome na minha lingua? "Winnie, o Poia". Que tal?


A foca e o Winnie de Pooh estava sentados debaixo de um pessegueiro, e a foca estava de papo para o ar a tentar relaxar. O Winnie de Pooh, de mãos mergulhadas em creme, tentava corrigir o escaldão que a amiga apanhara em Carcavelos, na tarde anterior.


- Continuo a achar a Rua Sésamo muito melhor do que a tua série, sabes? – disse a foca, virando-se agora de barriga para baixo.

- Já te expliquei que só o fiz pelo dinheiro – disse o Winnie de Pooh, e era verdade.

- Mesmo assim. Até o Poupas Amarelo tem um nome mais decente do que tu, e também é amarelo. Ao menos tem penas, e asas, e um bico. Continuo sem perceber o que é um Poupa, mas ok. Ele não dormia num ninho ou lá o que era?

- Era.

- Então era um pássaro. Ao menos não se chama Poupas o Poia não achas?

- É o problema das traduções.

- Deixa-te de lamúrias e barra-me as costas como deve ser, se fazes favor.

O Winnie de Pooh continuou a trabalhar no escaldão da amiga.

- Mas conta lá, fizeste a série por dinheiro? – perguntou a foca.

- Pois. Estava necessitado na altura.

- Como pode estar necessitado? Só comes mel.

- Sabias que o mel está completamente inflacionado?

- Oh Poia, espalha isso bem.

- Como te estava a dizer, precisava do dinheiro. Fui a alguns castings, incluindo para a Rua Sésamo.

- Para que papel?

- O da senhora que lá vive. Não é a velhota, é a mais nova.

- No meu país, essa era a Alexandra Lencastre. Sabes quem é a Alexandra Lencastre?

- Não. Também fiz o casting para os Teletubies.

- Olha, esses é que me assustam, os Teletubies.

- Nunca te contei que o Teletubie amarelo é meu primo?

- Oi. A sério?

- A sério. Só que fez uma fucinhoplastia para parecer mais humano. E a antena também não é dele.

- É verdade que eles têm um televisor na barriga, como aqueles frigoríficos?

- Sim. Nós víamos os jogos de basebol na barriga dele, e quando era para mudar de canal tínhamos de lhe rodar o nariz.

- Não sei se já te contei esta piada, mas sabes porque é que os chineses são amarelos?

O Winnie de Pooh reflectiu por momentos. Não, não sabia.

- Porque mijam contra o vento. – respondeu a foca, com um sorriso maroto.

O Winnie de Pooh procurou não ficar ofendido.

- Sabes, acho que vou criar uma série de televisão comigo próprio. Vai chamar-se, “Foca, o Ranholas”. O que achas?

- Já te disse que Pooh era só um nome.

- E porque é que andavas só de t-shirt? Não tens genitais?

- Tenho.

A foca dobrou o pescoço e espreitou por debaixo da t-shirt do urso.

- Não me parece. Diz a verdade. Tens genitais?

- Podemos falar de outra coisa?

- O Poupas também andava nu. O Pato Donald também. Como é que faziam, era com Photoshop? Não era mais barato comprar umas cuecas?

- Não percebes que é a questão da inocência? Somos todos personagens de programas infantis, as crianças conseguem ver o valor da história para além de termos genitais ou não.

- Isso não é inocência, é falta de educação sexual nas escolas. E as tuas histórias têm valor? “O Poia vai ao mel, o Poia faz amigos, o Poia faz chichi contra o vento”…

- Acreditas mesmo que sou amarelo porque faço chichi contra o vento?

- Bem, se a anedota o diz é por alguma razão. Estas a dizer que és melhor que os chineses?

- Se posso fazer chichi contra o vento mas ao mesmo tempo dizes que não tenho genitais, isso não faz sentido algum.

- Olha que os chineses agora abrem lojas por todo o mundo, e são bem sucedidos. São muito inteligentes, e têm uma vantagem evolutiva muito grande, que é terem os olhos em bico. Assim não lhes entram tantos mosquitos para os olhos, e pode olhar para as gajas giras na rua sem ninguém dar conta. Já reparaste que os chineses são todos iguais?

- Isso não é verdade.

- Claro que é. Um amigo meu, que é cientista, explicou-me que é por serem todos incestuosos. Casam-se com as primas uns dos outros, com os irmãos, com os sobrinhos, e assim ficam todos iguais. Por isso é que têm aquela coisa de amarrar os pés das mulheres para não crescerem. Eles dizem que é pela beleza, mas na verdade é para elas não fugirem. Já viste o que é teres relações sexuais com o teu primo? Olha, aí está. Imagina lá teres relações com o Teletubie amarelo. Não disseste que era teu primo?

- E é.

- Pois bem. Há alguma coisa que te faria praticares coisas menos próprias com ele?

- Claro que não!

- Sim, mas para além de não teres genitais.

- Mesmo assim.

- Pronto. Então se alguém quisesse que tu praticasses qualquer coisa com ele, prendiam-te os pés com umas cordas, atavam-te os atacadores com força e tu depois, com essa barriga toda, em vez de conseguires correr, caías para frente e não te levantavas mais. Percebes?

- Isso tudo para explicar porque é que os chineses são parecidos?

- Não, iguais.

- Ok, se tu o dizes.

- Não sou eu, já te disse. É um amigo meu que é cientista.

- É cientista de quê?

- O quê?

- Estuda o quê? Sociologia? Biologia evolutiva?

- Não, ele é ginecologista.

- O que é que isso tem a ver com a reprodução dos chineses?

- És mesmo burro, aqui se prova o que te estava a dizer. Falta educação sexual nas escolas. Então não sabes o que é um ginecologista?

- Sei.

- O que é?

- É uma pessoa que estuda e examina…

- Não é preciso dizeres, eu já sei o que é e podes ficar traumatizado, sabes, por não teres nenhum.

- Já te disse que…

- A questão não ficou bem resolvida, porque não me respondeste. Afinal tens genitais ou não?

- Isso é privado.

- Tens partes privadas?

- Se tenho partes privadas ou não é privado.

- E o teu primo Teletubie? Esses é que também não me pareciam nada ter genitais. Se ele tivesse qualquer coisa debaixo daquele fato espacial via-se o relevo.

- Não percebes o conceito de inocência? Aquilo era uma série para crianças.

- As crianças precisam de saber a realidade da vida. Deixa-me adivinhar, para ti os bebés vêem das cegonhas, não?

- Claro que não.

- É a sementinha do pai que entra no ovinho da mãe, certo?

- Claro, para explicares uma coisa assim a uma criança tem de ser com calma.

- Quando me explicaram isso fiquei a achar que o meu pai era um girassol e a minha mãe uma galinha.

- És mesmo ignorante.

- Era é inocente, Poia. Inocente.

- Em que é que acreditavas quando eras pequeno? Alguma coisa engraçada?

- Olha, lembro-me de achar que os ursos têm pila.

Houve uma pausa bastante longa.

- Depois acreditava nas coisas habituais – disse a foca – No Pai Natal, na Fada dos Dentes…

- Tu? No Pai natal? A sério?

- Era um puto, as sardinhas apareciam embrulhadas em cima das rochas à meia noite… Nunca pensei que fossem os meus pais a pescar aquilo. Agora que penso nisso e imagino o Pai Natal às voltas numa traineira a pescar sardinhas…

- Como seria se o Pai Natal andasse com peixe no trenó? Que mau cheiro!

- O Pai Natal deve ter um daqueles pinheiros de cartão com cheirinho, pendurado nos cornos das renas.

- As renas não têm cornos.

- Ai é, urso? Então têm o que?

- Hastes

- Haste tens tu em vez de pila.

Outra longa pausa.

- As renas têm cornos – insistiu a foca – Nunca viste uma rena?

- Sim, na televisão.

- Mas eles na televisão mudam o aspecto dos animais. Tu achas que elas têm hastes, mas eu digo-te que na realidade têm é cornos.

- Como sabes isso? Tu vives no mar.

- Tenho um primo que trabalha na TVI. Em todos os programas de Natal as renas que lá estão estão cobertas de próteses. Sabias que elas só têm duas pernas, como as avestruzes?

- Isso não faz o mínimo sentido.

- Faz sim. Eles metem-nas com 4 patas para poderem convencer os miúdos que são elas que puxam o trenó. Alguma vez uma avestruz conseguia puxar um trenó…

- Acho que o teu primo da TVI estava a gozar contigo.

- Porque é que ele estaria a gozar comigo sobre uma coisa tão séria? Achas isto uma brincadeira, urso Poia?

- Pára de me chamar Poia.

- Sim, Poia. Espalha bem o creme, se fazes favor. Estou todo gorduroso aqui abaixo do ventre mas na barriga não tenho creme. Este escaldão está a matar-me.

- Quem te mandou vir dar à costa em Carcavelos?

- O meu GPS avariou-se. Comprei-o a uma enguia minha amiga que faz contrabando destas coisas.

- Boa. Um GPS óptimo, para se avariar dessa maneira.

- E era de facto um óptimo GPS. Vim desde o Brasil com ele a funcionar lindamente. Quando cheguei a Cabo Verde ele começou a fazer interferências e à beira dos Açores apagou-se completamente. Quando cheguei a Carcavelos pensei que tinha ido dar à costa em Angola.

- Esse comentário é bastante racista, não achas?

- Porquê?

- Porque toda a gente sabe que em Carcavelos há bastantes pessoas de cor.

- Pessoas de que cor?

- Castanha.

- Então são castanhos?

- Não, são pessoas de cor.

- Para mim são pretos.

- Não achas isso algo depreciativo?

- Chamar alguém te preto?

- Sim.

- Porque é que haveria de ser? É a cor deles.

- Não chamas amarelos aos chineses, pois não?

- Estás a tentar insinuar que os chineses são todos amarelos?

- Tu próprio o disseste aqui há uns minutos!

- Não interessa. Estás a tratá-los por amarelos. É depreciativo. É sectarismo.

- Estás a virar a conversa contra mim!

A foca sorriu abertamente, orgulhosa.

- Não vejo qual é a piada. Tratar pessoas pela cor da pele – continuou Winnie de Pooh.

- Se eu fosse azul não me ofendia se me chamassem de Azul. Sabes porquê? Porque teria orgulho na minha cor de pele.

- Mas é uma questão de igualdade. Somos todos iguais, de uma forma ou de outra. Não é correcto estares a etiquetar as pessoas.

- Tu és um urso?

- Sou.

- És um urso polar?

- Não.

- Porquê? Tens alguma coisa contra ursos polares?

- Nada.

- Então porque é que não queres que te chame de urso polar?

- Porque não sou um urso polar.

- Mas se fosses não te importavas que eu te chamasse de urso polar?

- Hum… não…

- Pronto. Eu sou uma foca. Qual é o problema de me chamarem de foca e não de catatua? É o que eu sou.

- Mesmo assim. Há formas e formas de chamar alguém. Dizeres preto é diferente de dizeres pessoa de cor.

- Então e se houver pessoas vermelhas também são pessoas de cor?

- Er… sim…

- Então todos os que não são brancos são pessoas de cor?

- Não foi isso que eu disse…

- Então há uma diferença entre brancos e pessoas de cor?

- Ouve, não foi isso que…

- Ganda racista. E ainda tens a lata de me chamar sectarista ou que é!

- Chega desta conversa. Afinal o que te aconteceu em Carcavelos?

- Nada. Dei à costa, e aproveitei para lá ficar na praia um bocado. Depois comprei um gelado numa barraquinha, e fui comer o Calipto para cima de uma rocha. Quando dei por mim estava todo assado. Espalha bem o creme, Poia!

Winnie de Pooh espalhou o creme, e a conversa pode ou não ter continuado.

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