domingo, 13 de junho de 2010

Começou o Mundial

A selecção nacional, uma colecção de homens não necessariamente portugueses que “representa” o nosso país, ergue-se como um grupo de heróis que vem para trazer a alegria e a esperança. Os jogadores surgem em anúncios televisivos, como estrelas de televisão e heróis para a criançada. Grande parte da população veste as camisolas, sopra nas irritantes vuvuzelas e inunda os cafés e as ruas com as celebrações. A malta até se vai despedir dos jogadores ao aeroporto, como quando os pais deixam os filhos no autocarro para ir à visita de estudo. Os treinos são acompanhados quase obsessivamente, em directos diários vazios de informação relevante. As televisões interrompem o decorrer da emissão normal para transmitir as "declarações" do capitão da selecção nacional. Portugal vibra e não vê outra coisa à frente.

Este patriotismo que se constrói (só) em situações ou de catástrofe nacional (como na Madeira) ou de competições de futebol, é provavelmente a maior hipocrisia nesta onda de loucura. Só há um outro momento em que os portugueses se reúnam em tamanha demonstração de coerência e espírito de grupo, que é quando se manifestam contra o Governo repetindo coisas como “Isto só neste país” ou “Eu queria era ser espanhol”. As pessoas normalmente odeiam ser portuguesas e viver em Portugal, mas aparentemente esquecem-se disso quando o nosso país é representado por uma equipa de gajos a suar num relvado. Subitamente, e porque o futebol parece realmente mexer com as pessoas, toda a gente é portuguesa com um orgulho inchado e incontrolável, e qualquer pessoa que admita não gostar de futebol ou abominar todo este contexto é rapidamente apelidada de chata ou anti-social.

Ninguém quer saber de futebol (bem, mais ou menos), do Carlos Queirós ou dos jogadores da selecção durante os anos que separam os Europeus e os Mundiais. Mas assim que uma destas ocasiões chega, as televisões bombardeiam-nos com reportagens de duas horas sobre o que cada jogador coloca na torrada ao pequeno-almoço, em que consiste os seus exercícios de hidroginástica ou se estão com frio ou com calor. E, porque as televisões só passam aquilo que dá audiências, deduz-se que um grande número de pessoas realmente acompanha estas “notícias” com regularidade e, suponho, entusiasmo.

A pergunta que faço é: porquê? O que haverá de mágico e que parece contagiar toda a gente não só neste desporto, mas também em todo o pacote que o envolve? Porquê o fascínio por estas personagens que ganham milhões por saberem fintar e marcar golos e um ódio doentio pelos administradores que ganham milhões por gerir empresas multinacionais? Porquê sentir este patriotismo única e exclusivamente quando o que está em causa é a mais ridícula forma do nosso país ser representado? Porquê um desporto e não a ciência, a arte, a literatura? Parte da resposta parece-me clara, “porque a população, na sua maioria, asfixia-se na sua própria simplicidade”; mas o resto é um mistério para mim.

P.S.: Proponho o fuzilamento, sem direito a julgamento ou defesa em tribunal, do gajo que achou que as vuvuzelas seriam uma boa ideia.

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