segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Um imbecil-tão-imbecil

NOTA: Este post pode conter linguagem ou opiniões consideradas ofensivas para muita gente. Especialmente se forem católicas.


Henrique Raposo, um felizmente desconhecido cronista de opinião do Expresso, escreveu um corajoso e (acha ele) engraçado texto sobre a visita do Papa a Espanha. E na boa tradição dos católicos, o alvo principal não é o Papa em si (já agora podiam, uma vez ou outra, comentar aquilo que o Papa diz), mas sim (surpresa das surpresas), os homossexuais.

O que choca Henrique Raposo não são os milhões gastos por Espanha na visita Papal, muito menos as palavras retrógradas do Pontífice escondidas sob uma cama de mezinhas moralistas. O que choca este cronista é o que chocaria qualquer católico sério: dois homens a dar um beijo.

Para Henrique Raposo, o protesto dos “gays-tão-gays” não é um protesto, é uma provocação absoluta. Mais; é “soft porn”. Mais ainda, é exibicionismo!

Toda esta cena tem sérios problemas. Em primeiro lugar, é uma triste demonstração de exibicionismo sexual. Se eu demonstrar o meu "orgulho heterossexual", corro o risco de ser acusado de "machista" ou "marialva", mas se umgay demonstrar o seu "orgulho gay", ah, é logo considerado um bravo libertador, um pensador da liberdade.

Henrique Caroso, com certeza, nunca deu um beijo em público, muito menos sabe a diferença entre dar um beijo e “soft porn”. Isto mostra, da sua parte, dois “sérios problemas”. Primeiro, é curioso que alguém tão sexualmente reprimido se sinta preparado para opinar sobre os comportamentos dos outros. Como podemos levar alguém a sério quando diz que dois homens a dar beijos é soft porn? Isso significa, com certeza, que quaisquer duas pessoas a dar beijos na rua é exibicionismo. Henrique Carodoso, sempre que dá um beijinho à sua esposa (se a tiver), é com certeza um exibicionista machista. Ainda bem que não o faz em público. Isso seria uma provocação.

Segundo, há uma razão pela qual as pessoas começam a olhar para os gays como “bravos libertadores”: elas começam a perceber que não há nada de errado em dois homens ou duas mulheres aos beijinhos, muito menos em público; e que a posição da Igreja tem mudado ao longo dos anos. Hoje, os católicos tratam os homossexuais como pequenos desequilibrados sexuais. Há quinhentos anos, acenderiam a fogueira ou excomungariam o indivíduo. Ou pior. A civilização avança, e talvez um dia Henrique Raposo (que, pelos vistos, até já sabe usar a Internet) avance com ela.

Segue-se mais um comentário muito engraçado. Sim, porque Henrique Cardoso tem muita piada, ainda não se notou? Veja-se:

Depois, vamos lá ver uma coisa: o que é isso de "orgulho gay"? Se o desejo homossexual é tão natural como o desejo heterossexual, porque razão aquelas pessoas têm orgulho numa coisa que é natural? Se o desejo é natural, então a parte do "orgulho" não faz sentido.

Lógica implacável. Apliquemo-la: É natural um pai ter orgulho do seu filho? Sim. Logo, esse orgulho não faz sentido nenhum. É natural casar-me com a minha mulher? É. Logo, é estúpido ter orgulho na nossa vida a dois. Henrique Cardoso não sabe o que é ter orgulho. Ainda bem. Assim significa que não deve ter orgulho naquilo que escreve, o que faz dele uma pessoa mais sensata do que pode parecer à primeira vista.

Em segundo lugar, estas atitudes revelam uma profunda intolerância. Aquelas pessoas querem o quê? Querem que o Papa diga que o casamento gay é a melhor coisa do mundo? Meus amigos, o Papa e os católicos têm o direito às suas opiniões. Os católicos têm o direito de dizer que o casamento gay não devia ser legal. As opiniões são livres. No fundo, aqueles gays não toleram a ideia de alguém a pensar de forma diferente da sua. É sempre assim: os auto-proclamados donos da tolerância têm uma estranha atracção pela intolerância.

Primeiro que tudo, Henrique Cardoso não percebe a diferença entre “opinar” e “influenciar”. A razão por que muita gente a favor dos homossexuais não tolera a Igreja Católica não é por aquilo que esta opina; é pelas consequências práticas dessa opinião. A mim pouco me importa que um velho deplorável ache que a “Família” deve ser assim e assado; desde que esse velho deplorável não defina, através da simples autoridade religiosa, a forma de pensar de milhões de pessoas em todo o mundo, que vêem a sua palavra não como uma “opinião”, mas como um facto.

E, mais uma vez, Henrique Cardoso é incapaz de ver a falácia no seu próprio texto. Estará, com certeza, mais preocupado em torná-lo engraçado. Senão vejamos: Para ele, os homossexuais são intolerantes. Porquê? Ninguém está a exigir a ninguém que mude de opinião. Se há alguém que se auto-proclama dono da tolerância é o grupo de pessoas que garante que Jesus existiu, e que quer que toda a gente se ame a torto e a direito… desde que não sejam homossexuais exibicionistas, claro!

Resumindo: os representantes na Terra do Deus mais benevolente e tolerante que se pode imaginar defendem abertamente que os homossexuais são seres que não merecem o mesmo tipo de direitos que as outras pessoas; e os homossexuais, que procuram chamar a atenção para a normalidade e inocência das suas identidades sexuais, são um grupo de intolerantes exibicionistas. Não se pode acusar Henrique Cardoso de falta de coerência, muito menos de capacidades intelectuais. Afinal, ele é católico. Aquilo sai-lhe naturalmente. Os leucócitos intelectuais de Henrique Raposo não lhe permitem avaliar, na totalidade, o que é uma contradição intrínseca no seu raciocínio.

Segue-se a última infantilidade, também esta típica dos católicos:

Em terceiro lugar, estas demonstrações contra a - suposta - homofobia do Papa revelam uma profunda hipocrisia. Se quisessem mesmo lutar contra a homofobia motivada por líderes religiosos, estes gays podiam ir dar beijinhos para as portas das mesquitas (estou certo de que existem mesquitas em Espanha). Na Europa, as tais "comunidades muçulmanas" são rainhas e senhoras da homofobia. Portanto, a pergunta tem uma lógica cristalina:por que razão estes gays valentões não vão dar beijinhos à frente das mesquitas? Ide, valentes. Ide dar beijinhos ao pé do senhor imã.

Eu respondo à “lógica cristalina” deste guru: A razão porque os homossexuais se manifestam junto das autoridades católicas e não islâmicas é porque o peso das duas religiões, em países como a Espanha ou Portugal, não pode sequer ser comparável. A Igreja Católica faz muitíssimo mais pelo retroceder dos direitos civis dos homossexuais do que qualquer comunidade islâmica europeia; aliás, a grande maioria da população ibéria considera-se cristã ou católica, e não islâmica. A razão porque os homossexuais protestam contra a Igreja é porque esta é a sua principal antagonista, a principal força supersticiosa e retrógrada que leva a opinião pública a manter uma visão apertada e ignorante dos ateus, homossexuais, ou de temas como o aborto ou a eutanásia.

Em resumo, caro Henrique Raposo, a razão porque o menino e os outros católicos são perseguidos afincadamente é porque vocês não se calam com esses disparates. E até o dia em que a maioria da população compreenda que a vossa “opinião” leva à intolerância e ao fanatismo, e que a “nossa” leva à compreensão, à cooperação e à liberdade, o Papa continuará a ser (bem) recebido com este tipo de “exibicionismos”.


http://aeiou.expresso.pt/os-igaysi-valentoes=f614154

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