segunda-feira, 9 de maio de 2011

O armário

Um narigudo, um cristão e um tipo de cabelo elegante estavam, em conjunto e sob forte calor, a tentar tirar um móvel incrivelmente robusto, alto e largo de dentro de casa.
Disse o narigudo, carpinteiro responsável pela construção do móvel, que assim não iam lá, e propunha que fosse ele sozinho a resolver a questão. Para isso puxou as mangas para cima, encheu o peito de ar, mostrou músculo e limpou o suor da testa.
O tipo de cabelo elegante, tremendo, quase deixou cair do armário. Pessoas maiores e mais fortes que ele faziam-lhe confusão, e deixavam-no com tonturas. Talvez por isso quase largou uma das pontas do armário e ele embateu numa esquina. O narigudo musculado deu-lhe uma belinha ali mesmo, à frente de todos, e o resto dos habitantes da rua observaram tudo aquilo com um murmúrio de aprovação. “Isto sim é de homem”, comentavam, enquanto viam o armário no mesmo sítio.
O cristão aproveitou para dizer que tinha uma proposta que ia ao encontro das necessidades e problemáticas da ombreira da porta, do armário, dos outros armários da casa e, repare-se, das pedras da calçada. O narigudo também lhe saltou em cima com uma belinha, rasgou-lhe uns papéis, acusou-o de ter comprado dois submarinos há uns anos, e a população murmurou sussurros de aprovação impressionada. O narigudo era forte, e não é que estava mesmo a conseguir segurar o armário sozinho? E melhor, estava a aguentá-lo quieto, sem sair do mesmo sítio!
Do outro lado da rua, um velhote de boina e um rapazito de barba por fazer riam abertamente, agitavam os braços, diziam “por aí não, empurra para cá, mais à esquerda, menos à direita”, atiravam pedrinhas pequenas e chalaças; e alguns dos aldeões juntaram-se a eles, entusiastas, porque sentiram que aqueles dois sim, estavam mesmo a ajudar a tirar o armário de casa.
Assim ficaram mais umas horas e assim continuam, se o armário sai ou não para a rua é pergunta para depois.

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