sábado, 13 de agosto de 2011

Samora 43


- Nós humanos, que estabelecemos as hierarquias todas no mundo, somos muito maus a tratar a realidade pelo próprio nome – disse Samora num dia normal - Veja-me isto: o que está acima de tudo? O Homem e o valor da vida humana. E depois? Os animais, indefesas criaturas cujas tocas e ninhos destruímos na nossa ânsia capitalista e noutras ânsias ainda. E depois? As plantas; ao que parece é moralmente inaceitável ser-se omnívoro mas ainda ninguém se queixou dos vegetarianos. Que nos resta? Os minerais. Enumerei as quatro classes por ordem decrescente de importância aos nossos olhos e aos olhos da nossa subjectividade; mas analisemos melhor como são as coisas. Se há classe mais essencial que todas as outras é a dos minerais: as pedras não possuem essa coisa nebulosa chamada alma mas sem elas não havia chão onde assentar os pés. Depois as plantas, cuja brilhante invenção da fotossíntese tornou a atmosfera respirável; vê-las morrer a todas era condenar-nos à extinção mais cruel. Seguem-se os animais, que coitados são nossos primos na árvore da vida e possuem tanto direito de viver e reproduzir-se como nós sem lhes enchermos a cabeça; mas o seu papel no ecossistema não é de todo imprescindível. Mate-me uns milhares e sim, poderá até levar uns quantos outros à morte por subnutrição; mas bem vistas as coisas a vida continuará sem se queixar. E depois de tudo isto vem o nosso lugar: nós que nos achamos tão inteligentes e cultos e avançados e que olhamos para o planeta com as preocupações ambientalistas de um engenheiro que acha que consegue concertar um motor velho sem se dar conta de que é ele quem o anda a esforçar. Mate-nos a todos numa extinção em massa e verá que o planeta não nos chorará; os animais caminharam mais confiantes, sem medo de pisar armadilhas, as plantas florescerão e a Terra prosperará. Que bela hierarquia esta, que quando analisada à luz da razão mais clara revela-se estar montada de cabeça para baixo!

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